terça-feira, setembro 20, 2005

Cinema (2)

(Publicado originalmente a 19/5/2003.)

Escreve Pacheco Pereira no seu "Abrupto": «Uma das coisas que me faz ainda gostar mais do cinema americano e abominar a "excepção cultural" dos franceses é a capacidade que tem de manter o cinema como espectáculo e de tratar histórias complexas sem perder a complexidade. Porque imaginem o que a basófia filosófica dos franceses faria a histórias, como a do Blade Runner , do Matrix , ou do Minority Report , ou do Crash , ou as dos filmes de David Lynch transformando-as em filmes de tese , impossíveis de ver com prazer e perplexidade.». Claramente, não temos estado a ver os mesmos filmes franceses. A tendência predominante no cinema francês, pelo menos desde os anos 70, tem sido um naturalismo voltado para o quotidiano e para a exploração das relações pessoais (alcunhado depreciativamente de "cinema deux pièces cuisine"), cujos expoentes máximos são Maurice Pialat e Jacques Doillon, e cuja componente "filosófica" (mesmo entendida na sua acepção simplificada de "dada à reflexão sobre o mundo") é francamente ténue. Invertendo o sentido da especulação, não resisto a imaginar aquilo que faria o rolo compressor hollywoodesco de filmes como "Les Roseaux Sauvages", "La Reine Margot", "Conte d'Automne" ou "Ressources Humaines", para citar apenas alguns exemplos de obras relativamente recentes que obtiveram uma apreciável projecção no nosso país. Quanto à incompatibilidade entre filme "de tese" e "prazer", quem tem seguido este blog com um mínimo de regularidade sabe que ela não tem aqui direito de cidade.